Estranhos ritos celebram um perigoso dia. Em um mundo onde as
pessoas buscam posições, curiosamente festejamos o dia em que aquele que era
sobre todos ousou nascer como aqueles que eram os menores de todos. Na tradição
cristã, paradoxalmente, o Rei Deus não nasceu em berço de ouro, mas em uma
bacia de palha.
O perigoso dia, hoje celebrado por muitos, foi esperado com “temor
e tremor” pelo poderoso Herodes. Inacreditavelmente, ele temia que o nascimento
de uma criança ameaçasse a sua posição. Tamanho temor gerou uma ordem para o assassinato de milhares de crianças. Só tem medo de perder sua posição de poder
quem está nestes espaços, e para preservá-la, até hoje, crianças continuam tendo suas possibilidades de vida roubadas. Explico: todas as vezes que, por exemplo, gestores públicos entregam
setores do governo, como a educação, para grupos políticos aliados que não tem
nenhum compromisso ou projeto de educação, apenas para manter a tal
governabilidade, para manter seu poder; caminhos, possibilidades, futuros e
chances de milhares de crianças são roubadas, assassinadas.
Espaços de poder são perigosos e, quando não exercido comunitariamente,
sem participação coletiva, geram opressão. O Natal é o símbolo maior de quando o
maior poder já pensado, Deus, decidiu, em favor de todos, nascer outro. Nasceu
desapoderado, criança frágil, humana. Nasceu em uma bacia de palha, numa
periferia do mundo para, desse lugar, desafiar os nascidos em berços de ouro.
O nascimento do frágil e desapoderado Deus é perigoso porque
empodera os pequeninos, dá esperança aos fracos, ameaça qualquer poder
estabelecido e desautoriza as pretensões dos nascidos em berços de ouro.
Enquanto não retirarmos as vendas, do individualismo, do
consumismo, da sede por posição e poder, o natal não será um dia perigoso para a
política ou para os ricos cevados que nos empurram seus projetos de vida de
plástico que se deformam e deformam os projetos e os sonhos dos menores.